O quanto é perigoso ir para academia em tempos de pandemia de coronavírus?

Assim como muitos países, a Noruega ordenou o fechamento de todas as academias em março, para evitar a propagação do coronavírus. Mas, diferente de qualquer outro país, a Noruega também financiou um estudo rigoroso para determinar se os fechamentos eram realmente necessários.

Ao que parece, é o primeiro e único estudo aleatório a testar se pessoas que malham em academias com poucas restrições têm maior risco de infecção pelo coronavírus do que aquelas que não o fazem. Após duas semanas, a resposta provisória é: não.

 

A partir daí, seguindo as conclusões do estudo, a Noruega reabriu todas as academias, com as mesmas salvaguardas utilizadas no estudo.

Então há esperança para os frequentadores de academias de outras partes do mundo?

“Pessoalmente, acho que é um estudo generalizável, com uma ressalva”, disse o Dr. Michael Bretthauer, especialista em câncer da Universidade de Oslo que liderou o estudo junto com a Dra. Mette Kalager.

 

“Talvez existam lugares onde há muita covid ou onde as pessoas estejam menos dispostas a seguir as restrições”.

 

A Noruega está começando a controlar a epidemia, e o número de novas infecções diminuiu. Mas a incidência da infecção em Oslo, onde o estudo foi realizado, se assemelha à de cidades como Boston, Oklahoma City e Trenton, Nova Jersey.

O estudo, iniciado em 22 de maio, abrangeu cinco academias de Oslo, com 3.764 membros entre 18 e 64 anos de idade, os quais não tinham condições médicas subjacentes. Metade dos membros – 1.896 pessoas – foi convidada a voltar a malhar nas academias.

Eles foram obrigados a lavar as mãos e manter o distanciamento social: 1 metro de distância para os exercícios de musculação e 2 metros de distância nas aulas de alta intensidade. Os membros podiam usar os armários, mas não as saunas ou chuveiros. Não se exigia que eles usassem máscaras.

Outros 1.868 membros da academia serviram como um grupo de comparação; eles não tinham permissão para retornar às academias.

Durante as duas semanas do estudo, 79,5% dos membros convidados a voltar às academias foram malhar pelo menos uma vez, e 38,4% foram mais de seis vezes. Alguns ficaram muito felizes em retomar seus treinos.

Goril Bjerkan, economista de 53 anos que vive em Baerum, nos arredores de Oslo, frequentou a academia de três a quatro vezes por semana durante o estudo, usando a esteira, fazendo aulas e musculação.

“Foi fantástico voltar à academia depois de quase onze semanas de fechamento”, disse ela. “Acho que seria mais arriscado ir ao shopping do que voltar à academia”.

Heide Tjom, arquiteta de 57 anos que pedala por Oslo, aproveitou a oportunidade para voltar à academia quatro vezes por semana, onde malha com um personal trainer e faz aulas de cardio em grupo.

 

“Manter a forma é muito importante para mim”, disse Tjom. “Sinto que é uma coisa importante para a minha existência”.

 

Durante o período do estudo, houve 207 novos casos de coronavírus em Oslo. Os participantes do estudo e os funcionários das academias foram testados em 8 de junho (agora estão sendo realizados testes de anticorpos dos participantes).

Bretthauer e Kalager também examinaram o extenso banco de dados eletrônico de registros de saúde da Noruega para verificar consultas ambulatoriais e hospitalizações entre os participantes.

Os resultados? Os pesquisadores descobriram apenas um caso de coronavírus, numa pessoa que não tinha ido à academia antes de ser testada; pelo rastreamento, concluiu-se que ela se infectara no local de trabalho. Alguns participantes chegaram a procurar hospitais, mas para outras doenças que não a covid-19.

 

Não houve diferença entre os grupos quanto a essas idas ao hospital. E não houve consultas ambulatoriais ou hospitalizações por causa do coronavírus. Os resultados foram disponibilizados online, mas não foram analisados por pares, nem publicados.

Alguns especialistas consideraram que os resultados demonstram que o retorno à academia pode ser relativamente seguro – mas apenas em locais onde há poucas infecções.

 

“O estudo nos mostra que ambientes de baixa prevalência são seguros para o retorno às academias e, provavelmente, para quase todo o resto”, disse o Dr. Gordon Guyatt, professor de medicina da Universidade McMaster, no Canadá. “É muito improvável que você seja infectado”. “Mas, se você estiver num ambiente diferente, onde há uma prevalência substancialmente mais alta, não sabemos o que pode acontecer”, acrescentou ele.

 

Jon Zelner, epidemiologista da Universidade de Michigan, não achou o estudo muito convincente: “Esses resultados não me dizem que ir à academia não seja mais arriscado do que não ir à academia, mesmo em Oslo”, disse ele.

É necessário um estudo maior em locais com uma prevalência relativamente baixa para determinar se o vírus pode ser transmitido com facilidade nas academias, acrescentou Zelner. Ou, então, um estudo com menos pessoas, mas em uma comunidade com alta prevalência de infecção, poderia responder à pergunta.

Tal estudo pode suscitar questões éticas, pois talvez não seja seguro mandar as pessoas para as academias de ginástica em comunidades com alta prevalência – “seria uma espécie de armadilha”, disse Zelner.

Então, quão baixo deve estar o risco para que seja aceitável reabrir as academias e estúdios fitness?

Guyatt disse que os riscos de infecção em uma comunidade onde a prevalência é baixa podem ser menores que as vantagens para a sociedade.

 

“As pessoas não podem ficar trancadas para sempre”, disse ele. “Nunca estaremos completamente livres do vírus. E, num ambiente de baixa prevalência, o risco será baixo onde quer que você vá – academias, mercados e até restaurantes”.

 

Agora, Bretthauer e Kalager querem ver se as medidas de distanciamento social que eles usaram no estudo eram necessárias.

Eles planejam escolher aleatoriamente 150 academias para operar sem restrições ou apenas com as que já estão em vigor e, depois, comparar as taxas de infecção entre os frequentadores. O estudo ainda está em fase de planejamento.

Fonte: Gina Kolata, The New York Times – Life/Style / Tradução de Renato Prelorentzou. Publicado em 25.07.2020