Novembro Azul: câncer de próstata é o segundo que mais mata os homens, atrás somente do de pulmão

 

Alto-astral, esportista, atento com a alimentação e em cultivar bons pensamentos. Brincalhão, com boas tiradas, o construtor aposentado José Gonçalves da Silva Mendes, de 82 anos, é dessas pessoas de bem com vida e que exala sabedoria diante dos obstáculos que se apresentam. Ele faz parte do grupo que sabe lidar com o estresse e não deixa a angústia ou o desânimo colocá-lo pra baixo. Há pouco mais de dois anos, ele teve diagnóstico de câncer de próstata e encarou 37 aplicações de radioterapia para vencer a doença. Mesmo para os fortes, confessa, foi um susto e tanto. “Na realidade, vacilei. Para não dizer que errei ao não fazer os exames necessários. Só fui fazer o toque retal depois dos 80, com anos de atraso, mesmo com a família insistindo. O resultado foi que já estava num estágio grave, no penúltimo grau. Foi um choque.”

Choque que deu a ele força para lutar contra uma das doenças mais temidas. “Consultei-me com dois urologistas oncólogos, excelentes, e fiz meu tratamento pelo SUS, no Hospital Luxemburgo. Tive atendimento espetacular, fui incrivelmente bem cuidado. Fiquei mesmo foi impressionado com a quantidade de pacientes com câncer de próstata que chegavam por lá. Resisti bem ao tratamento e agora estou na contagem dos cinco anos, quando poderei dizer que estou livre da doença. Acredito também que praticar esportes desde cedo me ajudou muito. Jogo tênis, peteca, xadrez, buraco… pedra!”, brinca seu José.

A reação positiva ao tratamento ocorreu ainda porque ele tem boa saúde, não tinha nenhum outro problema. “Sem dúvida, isso me ajudou muito. E acredito que o fato de não ter omitido o câncer, de ter falado para a família, aberto o assunto, também contribuiu. Não me incomoda tocar no assunto, até para alertar as outras pessoas. O grande risco é não fazer os exames, tanto o toque retal quanto o controle do PSA. De preferência, anual. Na época em que descobri a doença, o meu PSA era 11, hoje está menos de um. É preciso vigiar. Não sou o típico homem com medo de médico, no entanto, por ser assintomático – não sentia nada, nenhuma dor -, acabei me descuidando. Temos de dar atenção ao nosso corpo”, aconselha.

Recuperado, na ativa e com o corpo em movimento, seu José recomenda que todos os homens “tomem cuidado com a alimentação, que deve ser balanceada, ingiram pouca gordura, bebam muita água, façam exercícios e consultas periódicas ao urologista, porque a especialidade faz parte do checape. Não mudei minha rotina, faço as mesmas coisas de antes, acrescentei um brócolis aqui, um aspargo acolá, sucos naturais – o de maracujá é ótimo –, e nada de estresse ou angústia”.

José Gonçalves é um personagem de alerta para todos os homens, ainda mais neste mês, quando, desde o dia 1º, para orientar a população, a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) começou mais uma edição do Novembro Azul. A campanha deste ano vai contar com palestras, ações de esclarecimento nas ruas com o Dr. Prost (personagem criado pela SBU para esclarecer ao público leigo sobre as doenças da próstata), live nas redes sociais, veiculação de mídias em transporte público e material informativo no site oficial da entidade: www.portaldaurologia.org.br/novembroazul.

No dia 20, representantes da SBU participam do 11º Fórum de Políticas Públicas e Saúde do Homem, na Câmara dos Deputados, em Brasília. O evento ocorre todos os anos, por sugestão da entidade, para discussão da saúde do homem. O tema deste ano é “A saúde do homem do campo”.

A campanha, adotada no mundo todo, nasceu em 2003, na Austrália, ligada ao Dia Mundial de Enfrentamento ao Câncer de Próstata, em 17 de novembro, e ao Dia Internacional do Homem, celebrado no dia 19. Dessa forma, houve grande adesão, fazendo do mês a principal época de alerta e estímulo à prevenção do câncer de próstata.

MATA 

O câncer de próstata é o segundo que mais mata os homens. Conforme o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), para o Brasil, estimam-se 68.220 casos novos de câncer de próstata para cada ano do biênio 2018-2019. Esses valores correspondem a um risco estimado de 66,12 casos novos a cada 100 mil homens. Ele é considerado câncer da terceira idade, já que cerca de três quartos dos casos no mundo ocorrem a partir dos 65 anos.

O Inca tem uma cartilha com o beabá do câncer de próstata que, por meio de informação segura, ajuda na quebra do medo, preconceito e desconhecimento, que são barreiras que impedem os homens de cuidar melhor da saúde. Câncer de próstata: vamos falar sobre isso? está disponível para que todos tenham orientação correta em mãos e um alerta para que cada homem se dirija a um médico, em caso de suspeita ou dúvida. O câncer de próstata, na maioria dos casos, cresce de forma lenta e não chega a dar sinais durante a vida. O risco aumenta com a idade. No Brasil, a cada 10 homens diagnosticados com a doença, nove têm mais de 55 anos. No entanto, há tumores que podem crescer de forma rápida, espalhando-se para outros órgãos e podendo levar à morte.
A reportagem conversou também com médicos e especialistas, que alertam sobre o risco de se descuidar da saúde. Avisam para não esperar os sinais para tomar uma atitude. Eles podem não vir e a doença só ser descoberta em grau avançado. Se você faz parte do grupo de risco, fique atento, e aja.

Quebrar barreiras
Consulta ao urologista uma vez ao ano deve fazer parte dos cuidados com a saúde do homem. É preciso entender que prevenir é a melhor escolha contra o risco real do câncer de próstata 

“Um a cada seis homens vai ter câncer de próstata.” A afirmação em tom de alerta é do urologista Arnaldo Fazoli, do Conselho Científico do Instituto Oncoguia e do Grupo de Próstata do Instituto do Câncer de São Paulo Octavio Frias de Oliveira (Icesp), ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). “O paciente tem que entender que o mais importante é evitar problemas futuros. Homens são imediatistas, costumam pensar frente ao problema e resolvê-lo. Caso ele não exista ou não tenha dado sinais de existir (ainda não o descobriu porque não apresentou nenhum sintoma ou não foi fazer os exames de rotina para descobri-lo), não têm por que se movimentar. Ou seja, não vão ao médico e ficam em estado latente.”

O número revelado acima por Arnaldo Fazoli é mais do que um chamariz, é um aviso para que o homem se preocupe, e muito, com o risco de virar estatística. “É nele que nos baseamos para que o homem preste atenção na sua saúde. Muitos pacientes me dizem: ‘Preocupo-me com a saúde, mas como não sinto nada…’. Aí está o risco, já que, se forem esperar sentir algo para procurar um médico, pode ser tarde demais.” Parece óbvio, mas a maioria continua negligenciando. No entanto, é cada vez mais raro o homem fugir do médico ou só ser levado por uma mulher. Ele está mudando. “Nos últimos anos, muitos homens estão percebendo que só há vantagens em fazer os exames preventivos, de rastreamento e o diagnóstico precoce.”

Apesar da alta incidência, Arnaldo Fazoli enfatiza que 90% dos casos diagnosticados em fase inicial têm cura. “Tanto se fala sobre o câncer, a cura já chegou ao de próstata. Mas, desde que o diagnóstico e o tratamento ocorram em fase inicial.” O bom é que a informação tem despertado o sexo masculino, principalmente iniciativas como a do Novembro Azul. “A campanha atinge um número de pacientes cada vez maior e todos saem ganhando. O importante é que falem sobre o assunto e saibam da real necessidade de ir a um urologista ao menos uma vez ao ano.”

Ao falar em próstata, o sinal vermelho acende para os homens quando pensam no temido exame de toque retal (agora chamado de toque prostático). “É o exame físico para detectar algum nódulo, já que, às vezes, a informação de risco do câncer de próstata não estará clara nos exames de sangue ou de imagem (como o ultrassom e a ressonância magnética). O homem pode ou não fazer. Não é obrigatório, mas, ao escolher não, deixará de fazer um diagnóstico que pode ter cura.”

É preciso deixar de lado o preconceito, que não é só antigo, mas inconcebível se pensarmos na saúde, no bem-estar físico e emocional. “Já passou da hora de o homem quebrar essa barreira com o urologista. Ele não deve ter medo, já que, consultá-lo, significa evitar problema futuro. Nada de ter vergonha, se preciso, nada de contar aos amigos e ter de lidar com brincadeiras. Ninguém tem de saber. O fundamental é se conscientizar do valor de uma vida saudável, que requer prevenção.”

Novo medicamento, nova esperança 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar medicamento para pacientes com câncer de próstata. A apalutamida é um inibidor do receptor de andrógeno, indicado em combinação com terapia de deprivação androgênica (ADT), para postergar o aparecimento de metástase naqueles pacientes que já fizeram o tratamento localizado, receberam ADT e, ainda assim, apresentam aumento do PSA (marcador sanguíneo). O novo medicamento demonstrou diminuir em 72% o risco de progressão para metástase ou de morte e proporcionou 40,5 meses de sobrevida livre de metástase (mediana), o que representa um ganho de dois anos quando comparado ao placebo (16,2 meses). “Esse medicamento representa grande avanço para uma situação grave do câncer de próstata que já falhou ao tratamento hormonal. A apalutamida possibilita postergar o aparecimento da metástase, que é justamente a parte mais temida da doença, e adia também os efeitos secundários desse processo, impactando positivamente na qualidade de vida do paciente”, destacou Fernando Maluf, oncologista clínico e diretor médico do Centro Oncológico da Beneficência Portuguesa de São Paulo, membro do Comitê Gestor do Hospital Israelita Albert Einstein e diretor do Centro de Oncologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília. “O Brasil é o quinto país a receber a aprovação de apalutamida”, disse Telma Santos, diretora médica da Janssen Brasil. Agora, o produto passará por processo de aprovação de preço na Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed).

Informação é tudo
Médicos alertam sobre a necessidade de incluir o urologista na lista do checape anual que todo homem deve fazer. Tratamento está avançado e a cura é de 90% com diagnóstico inicial 

Todo homem acima dos 50 anos deve fazer o exame prostático anual. A indicação é da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), segundo o urologista Francisco F. Horta Bretas, coordenador do serviço de urologia da Rede Mater Dei de Saúde. “O câncer de pulmão é o tumor que mais mata no homem, o segundo é o de próstata”, alerta.

Pela gravidade do problema, Francisco Bretas destaca a importância de campanhas como a do Novembro Azul, para informar a população. “Acredito que o nível de conhecimento e alerta sobre a doença seja maior nas cidades de médio e grande portes, que têm mais facilidade de acesso a informações, maior acesso aos especialistas e, por causa disso, eles procuram realizar exames periódicos. Se considerarmos, no entanto, todas as regiões do Brasil, incluindo as zonas rurais e pequenas comunidades, infelizmente, não enxergo a mesma preocupação presente em toda a população. Ainda existe certa resistência, fruto, em maior parte, do preconceito e da desinformação.” Mas o médico ressalta que a campanha, por ser mundial, é muito importante ser bem conduzida no país, já que o câncer de próstata é o segundo em letalidade e o mais comum no homem.

Francisco Bretas destaca que a Rede Mater Dei de Saúde também estará engajada na luta contra essa doença. “Como é uma campanha encabeçada pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), realizam-se mutirões no país, e nós, do Mater Dei, vamos, em um fim de semana, examinar os pacientes que nos procurarem, numa ação que temos repetido ao longo dos anos (a data ainda será anunciada).”

Além dos exames mais comuns utilizados no diagnóstico, como o PSA (exame de sangue) e toque retal (exame físico da próstata), Francisco Bretas chama a atenção para a ressonância multiparamétrica da próstata. “É um exame moderno. Com ele, podemos identificar mesmo os tumores não palpáveis. É uma ressonância diferenciada. Ainda não está disponível no SUS, mas é coberta por todos os planos de saúde.” Ele destaca também a existência de painéis de marcadores biomoleculares para câncer de próstata, indicados para pessoas com parentes próximos que tenham tido a doença (exame parecido foi feito pela atriz Angelina Jolie, específico para o câncer de mama, quando ela descobriu alta probabilidade de vir a desenvolver a doença e optou por realizar a remoção das mamas).

O urologista avisa: “Não há como prevenir o câncer de próstata, mas sim fazer o diagnóstico precoce”. Daí ser fundamental acompanhar sua saúde como um todo, ainda que o corpo não dê sinais de algo errado. Francisco Bretas lembra que, com o envelhecimento da população brasileira, o número de casos tende a aumentar: “O câncer de próstata, em geral, acomete homens acima dos 50 anos. Com o brasileiro vivendo mais, e com métodos de diagnóstico mais apropriados, resultado dos avanços tecnológicos, é compreensível o aumento da curva de prevalência”, diz.

CURA 

O câncer de próstata tem alto índice de cura, principalmente se descoberto na fase inicial. Francisco Bretas enfatiza três fatores principais que propiciam a cura: “As chances serão maiores se o PSA for abaixo de 10, se o tumor não tiver células muito agressivas e, por último, se a lesão estiver restrita à cápsula de próstata (confinada dentro da glândula). Com esse quadro, o paciente tem grande possibilidade de cura. Esses três fatores, em geral, ocorrem em quem faz o controle prostático regular.”

O urologista lembra, ainda, que o tratamento curativo é feito apenas para homens que tenham acima de 10 anos de perspectiva de vida. Nos casos de tumor localizado, pode ser feita a cirurgia convencional, a laparoscópica ou a robótica, que tem recuperação mais rápida. Quando realizada por um cirurgião bem treinado, o médico destaca, haverá pequeno risco de incontinência urinária e disfunção erétil. “Além da cirurgia, a radioterapia também pode ser utilizada nos casos iniciais. Nos casos mais avançados, com metástases, realiza-se, em geral, o bloqueio hormonal, e existem hoje medicações modernas, chamados bloqueadores hormonais de terceira geração, disponíveis e aprovados no país, com excelentes resultados.” Francisco Bretas ressalta que “os homens acima de 80 anos, que tenham características favoráveis da próstata (PSA e toque retal normais, sem sintomas), talvez não precisassem mais fazer o controle prostático.”

Remoção total da próstata

Para o urologista Arnaldo Fazoli, do Conselho Científico do Instituto Oncoguia e do Grupo de Próstata do Instituto do Câncer de São Paulo Octavio Frias de Oliveira (Icesp), ligado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), o melhor tratamento na fase inicial da doença, quando ela ainda está localizada, é a cirurgia de prostatectomia radical, em que a próstata é totalmente removida e pode ser feita via robótica. Outra alternativa é a radioterapia. “A cirurgia robótica está na rede privada e, com algumas exceções, no sistema público. No Icesp temos o Da Vinci (robô), mas, por ser de custo elevado por procedimento, ainda está em fase de estudo a viabilidade no serviço público de saúde. Com o robô, participo de mais de cinco cirurgias por semana no serviço privado.”

Além da carga preconceituosa, Arnaldo Fazoli conta que o homem também lida com possíveis efeitos colaterais causados pelo tratamento. “Como a próstata fica próxima a órgãos nobres, estes podem ser lesados. Então, há dois riscos principais: incontinência urinária e impotência sexual. Com a cirurgia robótica, praticamente foi eliminada a incontinência. Já a impotência depende do quadro de saúde do paciente e do grau de estágio do câncer.”

RASTREAMENTO 

Vale registrar que a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) recomenda a consulta com o urologista para definir individualmente o rastreamento do câncer de próstata, tendo em vista que o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS) não o recomendam. Arnaldo Fazoli explica que a orientação é “porque o câncer de próstata tem comportamento diferente quanto ao grau de agressividade do tumor. Tem o indolente, com crescimento lento e pouco agressivo, quando o paciente não precisa ser operado, só acompanhado. E o mais agressivo, que dá metástase nos ossos, insuficiência renal e torna a vida muito ruim. Se for o indolente, fazemos um tratamento de vigilância ativa, ou seja, acompanhamos a evolução do tumor. Mas lembrem-se de que não mapear não é não acompanhar”, avisa.

Exames investigativos

» Toque prostático: o médico avalia tamanho, forma e textura da próstata, introduzindo o dedo, protegido por uma luva lubrificada, no reto. Esse exame permite palpar as partes posterior e lateral da próstata e detectar algum nódulo

» PSA: exame de sangue que mede a quantidade de uma proteína produzida pela próstata – antígeno prostático específico (PSA). Níveis altos dessa proteína podem significar câncer, mas também doenças benignas da próstata

» Biópsia: para confirmar a doença é preciso fazer biópsia. Nesse exame são retirados pedaços muito pequenos da próstata, para serem analisados em laboratório. Ela é indicada caso seja encontrada alguma alteração no exame de PSA ou no toque retal.

Fonte: American Cancer Society 

Números de casos 

» Brasil: estimam-se 68.220 casos novos de câncer de próstata para cada ano do biênio 2018-2019. Esses valores correspondem a um risco estimado de 66,12 casos novos a cada 100 mil homens

» Sudeste: estimam-se 30.080 casos novos de câncer de próstata para cada ano do biênio 2018-2019. Esses valores correspondem a um risco estimado de 69,83 casos novos a cada 100 mil homens

» Minas Gerais: estimam-se 6.730 casos novos de câncer de próstata para cada ano do biênio 2018-2019. Esses valores correspondem a um risco estimado de 63,80 casos novos a cada 100 mil homens

» Belo Horizonte: estimam-se 980 casos novos de câncer de próstata para cada ano do biênio 2018-2019. Esses valores correspondem a um risco estimado de 81,20 casos novos a cada 100 mil homens

Fonte: Inca 

Fonte: Site Saúde Plena